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Como manhã repicava seus dedos no alumínio da veneziana e a abria
Era o bojo cheio da cortina era a cortina o farfalhar da cortina era
Fora bem lá os carros alaridos batidas fuligens histórias de pessoas e pessoas
Dentro mais que dentro
No intra o farfalhar das cortinas o chiar do chinelo
Cochichando a poeira no passo
Meus olhos viam um bom dia quando se abriam
Eram invitados e como eram invitados a sua imagem
Como era tanto o que não era? E era tanto que
De tanto ser era:
Me erguia para conquista-la todo dia
Quando feito manhã

Quente mesmo exausta quente mesmo quando vazia quente
Noite era uma balada no rádio os dentes trabalhando a maçã
Um copo vazio de vinho antes
Quente banho quente mesmo calor quente mesmo verão
De portas abertas janelas abertas era quente e não ser
Não era ela sem balada no rádio sem maçã estalando
Sem vinho não era mas era
Pós isso pós tudo quente
Mesmo exausta mesmo vazia como noite era:
Dormir era só para vê-la outra vez como manhã.

Mas tarde como agora é feito tarde
Nem manhã nem noite é tarde e é triste
Há muito tempo é tarde e é triste e é chato
Lembrar manhãs em que não repicam dedos em alumínio de veneziana
Nem há bojo nem há farfalhar de cortinas não há cortinas não há
Nem cochicho nem chiar que poeira ouça pois não há poeira:
Meus olhos se abrem ao som que vem de lá de fora.
Porque a tarde é triste é triste e chata porque antecede a noite
A noite é solitária e fria sem radiofonia maçã ou vinho
Fria fria fria solitária e fria como nunca fôra:
Nunca foi fora de mim ser tão sozinho.
Fria mesmo calor fria mesmo verão
Pois tarde como agora é feito tarde
Nem manhã nem noite é tarde e é triste e é chato
Lembrar que foi feito manhã um dia que já foi
como noite um dia.

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